DOCUMENTAÇÃO TÉCNICA – Preenchimento e Atualização

Para tratar do assunto documentação técnica, inicio este artigo enfatizando que aeronavegável é aquela situação na qual a aeronave encontra-se em condições seguras de operação, se forem observados e aplicados os seguintes tópicos:

1. Estar de acordo com o projeto de tipo;

2. Estar com grandes modificações e alterações baseadas em dados técnicos aprovados;

3. Estar em conformidade com todas as diretrizes de aeronavegabilidade aplicáveis,

4. Ser corretamente mantida de acordo com um programa de manutenção aprovado;

e.

5. Como fechamento desses procedimentos que atestam a aeronavegabilidade, o correto preenchimento e atualização da documentação técnica (por exemplo: cadernetas de célula, motor, hélice e demais documentos pertinentes).

Lembrando que, Manutenção de Aeronaves, são ações requeridas para manter a aeronavegabilidade e a confiabilidade prevista no projeto das aeronaves, seus sistemas, subsistemas, e componentes, durante toda a vida operacional da mesma.
Para qualquer tipo de operação e emprego de aeronaves, essas devem estar em perfeitas condições de aeronavegabilidade, sendo que dentre as condições exigidas pela autoridade de aviação civil brasileira, está o preenchimento correto, atualização e a adequada conservação da documentação técnica, independentemente do fabricante, modelo e emprego das mesmas.
Este registro técnico tem no seu contexto como sendo primários e imprescindíveis para o controle correto dos tempos entre revisões da aeronave e seus sistemas, permitindo que componentes e acessórios, possam cumprir suas funções, evitando mau funcionamento e consequências que possam ser de considerável gravidade.
Tendo essas afirmativas como premissa, temos todo um acervo de legislação específica tratando do preenchimento e controles de manutenção, que é de caráter obrigatório seu cumprimento pelos proprietários/ operadores, mas mesmo assim é observado que a documentação supracitada, contém incorreções e a maioria está desatualizada fazendo com que esses documentos percam sua credibilidade, além de demonstrar o descumprimento da legislação em vigor.

Por definição uma ocorrência aeronáutica é o resultado de uma série de fatores que combinados e somados contribuem para incidente ou acidente, tendo essa documentação de manutenção discrepante, participação decisiva na formulação das prováveis hipóteses do ocorrido.
Poderia aqui citar diversas legislações, que estão diretamente ligadas aos registros das atividades de manutenção executadas nas aeronaves e seus sistemas, porém o que não está escrito, assinado por pessoas habilitadas e homologadas para execução/ inspeção dos serviços, considera-se que não foi realizado, bem como a falta de registro das horas de operação, inspeções, substituições de componentes, cumprimento de diretrizes de aeronavegabilidade, e outras tantas informações técnicas que são de registro obrigatório nos respectivos documentos.
Na qualidade de Elemento Certificado e atuando como integrante de equipes de investigação de ocorrências aeronáuticas gostaria de chamar a atenção dos proprietários/ operadores, para a importância do conjunto onde, manutenção adequada + registros atualizados, tenha como resultado, um voo operacional e principalmente seguro.

Poderia aqui nesse espaço, apresentar dados estatísticos, tirados de Relatórios Finais de incidentes, incidentes graves e acidentes aeronáuticos, porém acredito que todos podem ter acesso a integra dos referidos RF, pois após a sua publicação no site do CENIPA são de caráter ostensivo e com as recomendações pertinentes as ocorrências, é possível compreender que, por vezes, para operação de risco como é a atividade aérea é preciso atentar, observar, orientar e outras atitudes que irão nos permitir gerenciar esses riscos e trazê-los aos níveis aceitáveis de segurança.

Retomando a questão dos documentos técnicos das aeronaves, cabe ressaltar que desde a primeira página ou Termo de Abertura, já devem ser observadas regras de preenchimento sendo que no restante do conteúdo, as anotações devem ser legíveis, sem rasuras, para que aqueles que irão executar algum procedimento de manutenção possam ter a plena garantia que os motivos da inspeção, remoção/ instalação e/ou cumprimento de alguma diretriz, estejam sendo cumpridas no período correto de horas ou calendário, conforme previsto pelo programa de manutenção da aeronave ou seus sistemas

Como exemplo, posso citar que quando a ocorrência é originada por uma possível falha de motor, além das verificações rotineiras, também é feita uma varredura na integra de documentos, fichas, mapas de controle e demais registros, daquele motor para buscar os possíveis fatores contribuintes, pois através dessas análises, exames, desmontagens e outros procedimentos tentarem delinear quais as hipóteses prováveis da falha visando emitir as recomendações de segurança concisas e dependendo da complexidade do problema, ações imediatas de mitigação ou eliminação da falha apresentada.

Cabe ressaltar que, para o desenvolvimento desses processos, necessitamos de informações corretas e atualizadas as quais vem de encontro ao exposto nesse artigo, para que possamos descartar qualquer irregularidade que venha a descaracterizar o princípio da investigação SIPAER que tem o propósito de buscar os fatores contribuintes da ocorrência, mas caso seja detectada alguma inconsistência a investigação é suspensa de imediato e passa a condição de simplificada, já que não irá acrescentar nada para Prevenção.

Transcrevo frações de um relatório final simplificado tratando de ocorrência aeronáutica, na qual a falta de preenchimento adequado da documentação técnica foi observada, apesar deste relatório já estar publicado no site do CENIPA, não irei colocar neste artigo, informações sobre matrícula, local e data do acidente, pois o intuito é somente esclarecer, exemplificar e, principalmente, alertar aos proprietários/ operadores, importância dos registros técnicos da aeronave, estarem em ordem:

RELATÓRIO FINAL SIMPLIFICADO

1.1. Histórico do voo

A aeronave decolou de uma pista não homologada, para fazer voos de aplicação de defensivo agrícola em uma lavoura de soja, sem plano de voo e com apenas o piloto a bordo.

Durante a aplicação, ao fazer uma curva de reversão para o arremate final da área, e voando abaixo de cabos de alta tensão de torres de distribuição de energia elétrica, ocorreu a colisão da asa esquerda contra dois fios situados a 19 metros de altura.

Houve o seccionamento da asa e a aeronave perdeu altura até a sua colisão contra o solo, 57 metros à frente, resultando em capotamento e parada final no dorso.

A aeronave ficou destruída, com separação das superfícies de comando, deslocamento do berço do motor, flexão das pás da hélice e avarias substanciais no trem de pouso e na fuselagem.

O piloto faleceu no local, vítima de traumas crânio-encefálico e torácico.

A ocorrência não foi comunicada ao SIPAER pelo operador. O SERIPA da área só tomou conhecimento deste acidente por meio de uma ligação telefônica feita pela Polícia Militar da localidade ao SALVAERO.

Durante a ação inicial, foi constatado que a aeronave estava com o Certificado de Aeronavegabilidade (CA) suspenso pela ANAC – código 7 (não cumprimento de NCIA), a bomba de combustível e o starter estavam sem plaqueta de identificação, o governador e a hélice apresentavam identificação em desacordo com o RBAC 45. Da mesma forma, a bomba injetora com registro de instalação em 02DEZ2015, não condizia com a que estava instalada na aeronave no dia do acidente.

Além disso, a empresa agrícola estava operando sem possuir um Certificado de Operador Agrícola (COA) emitido pela ANAC e não tinha as cadernetas de motor, hélice e célula anteriores à data da compra da aeronave, não existindo nenhum registro histórico dos serviços de manutenção realizados antes da sua chegada à empresa. Verificou-se, também, que as cadernetas da aeronave estavam desatualizadas e que a empresa não estava cumprindo o programa de manutenção previsto pelo fabricante.

Constatou-se, ainda, que esta aeronave havia sofrido um acidente em data anterior, tendo sido recolhida, na época, à seguradora.

Diante de tais não conformidades, torna-se inócua, do ponto de vista da Segurança de Voo, qualquer tentativa de elucidar a ocorrência. ==================================================================

3. INTERRUPÇÃO DA INVESTIGAÇÃO

A operação em desacordo com as legislações aeronáuticas em vigor pode implicar níveis de segurança abaixo dos mínimos aceitáveis estabelecidos pelo Estado Brasileiro, conforme a lei nº 7.565, de 19 de dezembro de 1986 que dispõe sobre o Código Brasileiro de Aeronáutica, em seu Capitulo IV que trata do Sistema de Segurança de Voo, na Seção I que versa sobre os Regulamentos e Requisitos de Segurança de Voos, em seu Art. 66.

O Art. 88-A, §2º, determina que: “A autoridade de investigação SIPAER poderá decidir por não proceder à investigação SIPAER ou interrompê-la, se já em andamento, nos casos em que for constatado ato ilícito doloso relacionado à causalidade do sinistro e em que a investigação não trouxer proveito à prevenção de novos acidentes ou incidentes aeronáuticos, sem prejuízo da comunicação à autoridade policial competente”.

A Norma de Sistema do Comando da Aeronáutica de número 3-13 (NSCA 3-13) dispõe no seu item 4.2.15 que: “Caberá ao CENIPA, a qualquer momento, a interrupção da investigação de uma ocorrência aeronáutica, quando verificar a existência de indícios de crime ou que a mesma decorreu de violação a qualquer legislação aeronáutica em vigor ou que a investigação não trará conhecimentos novos para a prevenção”.

De acordo com a legislação em tela, os níveis mínimos de Segurança definidos pelo Estado Brasileiro são garantidos por meio do cumprimento dos Regulamentos Brasileiros de Homologação Aeronáutica (RBHA) ou Regulamentos Brasileiros de Aviação Civil (RBAC).

Ao se deixar de atender aos requisitos de Homologação/Certificação, podem-se criar condições inseguras latentes as quais deverão ser eliminadas ou mitigadas por meio do cumprimento da própria regulamentação.

Assim, torna-se infrutífera qualquer tentativa de atuação, dentro da esfera de competência do SIPAER, visto que qualquer ação corretiva ou recomendação de segurança, advindas da análise dos fatores que contribuíram para a ocorrência aeronáutica, recaem sobre a estrita observância dos regulamentos ora estabelecidos.

Para encerrar, quero deixar evidente que faço essas considerações e alertas, no sentido único da Prevenção e Segurança de Voo, ou seja, pela ótica SIPAER, no intuito sempre voltado para a preservação de vidas humanas em primeiro lugar e dos recursos materiais, pois qualquer ocorrência aeronáutica nos leva a custos diretos e indiretos, sem contar a vida humana que, até se prove em contrário, não tem preço.

Bons e seguros voos a todos.