Sustentabilidade: o novo critério de aferição para a aviação agrícola brasileira

As demandas mundiais relacionadas a preservação do meio ambiente, ao uso consciente de recursos naturais e as questões sobre mudanças climáticas, vêm colocando o agronegócio brasileiro no centro das discussões globais sobre os impactos da produção de seus 4 principais produtos: alimentos, rações, fibras e combustíveis. Alicerçada no equilíbrio de seus três pilares: social, econômico e ambiental, a sustentabilidade surge como fundamento para o planejamento de todas as atividades produtivas, e de forma ainda mais significativa, no agronegócio, em função de sua dependência direta por recursos naturais. E, nesse contexto, é preciso discutir o papel da aviação agrícola.

Considerando a proposição da Agenda 2030 da ONU (Organização das Nações Unidas), nenhuma atividade produtiva no mundo possui relação com tantos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) quanto a agricultura. Seja de forma direta, por meio do ODS 2 – Fome Zero e agricultura sustentável, ODS 6 – Água e Saneamento, ODS 7 – Energia limpa e acessível e ODS 13 – Ação contra a mudança global do clima; ou indireta, relacionada aos ODS 1 – Erradicação da Pobreza, ODS 3 – Saúde e bem-estar, ODS 8 – Trabalho decente e crescimento econômico, ODS 12- Consumo e produção responsáveis, ODS 14 – Vida na água e ODS 15 – Vida terrestre.

A aviação agrícola pode ser considerada um instrumento para o desenvolvimento do agronegócio brasileiro e que vem, há décadas, contribuindo com o aumento da produtividade nas mais diversas culturas. Dentre algumas de suas funções, por meio do combate a pragas e doenças, esse setor permite uma redução nos riscos da atividade agrícola mitigando as perdas observadas na colheita. Porém, como todo instrumento, precisa estar regulado.

No dia a dia das empresas do setor o termo regulagem sempre esteve relacionado a vazão ou a taxa de aplicação (litros/ha). Porém, em função das atuais exigências do mercado consumidor, seja de forma direta, pelos agricultores, ou indireta, pela sociedade, aqui propõe-se olhar para o termo “regulagem” de uma forma mais ampla e aplicada a esse novo contexto. A sustentabilidade como o novo critério de regulagem e aferição do instrumental aeroagrícola.

Apesar da sustentabilidade buscar o equilíbrio entre as três dimensões, até hoje a dimensão econômica (lucro) tem sido o pilar central das estratégias e ações das empresas. Porém, no caso do setor aeroagrícola, mesmo estando atento ao cumprimento das legislações ambientais e sociais, por ser uma atividade com riscos inerentes e de impacto na coletividade, as dimensões social e ambiental passam a assumir um papel decisivo e fundamental na definição das estratégias das empresas do setor.

Do ponto de vista ambiental, sustentabilidade e eficiência podem ser entendidos como termos complementares ou, porque não dizer, sinônimos. Produzir mais utilizando menos recursos é a base do conceito de eficiência que fundamenta os debates bioeconômicos pelo mundo. Aliar o princípio da eficiência à redução do impacto ambiental é o grande desafio, tanto para o agronegócio como para o setor de aviação agrícola.

A evolução tecnológica vem contribuindo a cada ano com ganhos em eficiência. Isso se apresenta, por exemplo, por meio da maior capacidade das aeronaves (maior rendimento e menor vazão por unidade de área); pelo instrumental utilizado (DGPS, marcadores, aplicativos, etc.), que garante também transparência nas informações; ou pelo monitoramento das condições meteorológicas ideais para aplicação exitosa dos insumos.

Entretanto, investir em tecnologias voltadas à sustentabilidade e não mensurar seu impacto é uma forma pouco eficaz de valorar esses benefícios e comunicá-los à sociedade. Por mais eficiente que a aviação agrícola seja, é preciso que essa eficiência seja mensurada e a informação disponibilizada para a sociedade. A Bioeconomia propõe diferentes métricas para mensurar os impactos sociais, econômicos e ambientais, dependendo do recurso natural a ser avaliado.

É possível citar alguns exemplos:

  • Pegada Hídrica: Permite a mensuração da eficiência no uso da água tanto para aplicação, como a água utilizada para descontaminação. As pesquisas podem ser realizadas comparativamente entre aeronaves de diferentes portes, entre diferentes equipamentos (tratores e autopropelidos), ou avaliando diferentes protocolos de descontaminação.
  • Análise do Ciclo de vida (ACV): A partir da ACV é possível avaliar e comparar o desempenho e o impacto ambiental dos motores de aeronaves que utilizam diferentes combustíveis, como querosene, avigás e etanol. A eficiência em relação a emissões, também pode ser comparada frente ao rendimento de tratores ou pulverizadores.
  • Análise de Fluxo de Energia e Materiais: Essa métrica permite, a partir da avaliação dos fluxos e estoques de matéria e energia de um sistema, identificar processos ou produtos mais sustentáveis. Na aviação agrícola esse método pode ser utilizado tanto para determinar a eficiência de aeronaves como para identificar gargalos na gestão de processos.

Inúmeras são as opções para mensurar o desempenho e a eficiência da aviação agrícola. No entanto, isso dependerá do propósito e do objeto de análise. Em tempos de agricultura sustentável a aviação agrícola apresenta-se como um potencial instrumento para a sustentabilidade. Nesse caminho, além da prestação de um serviço mais eficiente, a aviação agrícola também pode ser utilizada para aplicação de produtos de origem biológica (bioinsumos), no reflorestamento, ou como veículo estratégico no combate a incêndios. Os avanços tecnológicos para aviões, e demais tipos de aeronaves, como o caso dos drones ou helicópteros, são potenciais aliados nessa prestação de um serviço sustentável.

O desenvolvimento socioeconômico de um país é potencializado pela segurança alimentar e energética que promove a partir do uso de fontes renováveis. Esse desenvolvimento deve ocorrer às custas do uso responsável e da preservação de recursos naturais envolvidos na produção. E nesse contexto, a aviação agrícola, como instrumento envolvido na produção, desempenha papel importante nesse caminho em direção a sustentabilidade. Enquanto agentes ou setor diretamente responsáveis por esse processo, somente a partir de um posicionamento que alinhe investimentos em sustentabilidade, é que o setor de aviação agrícola demonstrará cada vez mais para a sociedade a sua relevância e comprometimento, tanto para as gerações atuais quanto futuras.