A Aviação Agrícola como atividade essencial e as principais regras trabalhistas no período de quarentena

A Aviação Agrícola como atividade essencial e as principais regras trabalhistas no período de quarentena

08/04/2020

Para justificar a afirmação constante do título, cabe análise da legislação que trata da pandemia de coronavírus.

Inicialmente, ante a intenção de repatriar brasileiros residentes em Wuhan, na China, e a necessária quarentena e submissão compulsória destes a procedimentos médicos, quando em solo brasileiro, uma vez que a Constituição Federal consagrou o princípio da legalidade (“ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”) e o direito de livre locomoção como Direitos e Garantias Fundamentais do Cidadão, o Governo Federal enviou ao Congresso Nacional Projeto de Lei que, aprovado, deu origem à Lei Federal nº 13.979, de 06/02/2020, que estabelece normas de isolamento e quarentena, entre outras medidas.

A partir desta Lei, foi publicado o Decreto nº 10.282, de 20/03/2020, que considera atividades essenciais, dentre outras, as relacionadas a: “prevenção, controle e erradicação de pragas dos vegetais e de doença dos animais”.

Também considerou essenciais as atividades acessórias, de suporte e a disponibilização dos insumos necessários a cadeia produtiva relativas ao exercício e ao funcionamento desta atividade, proibindo a restrição à circulação de trabalhadores que possa afetar o funcionamento da mesma, e de cargas de qualquer espécie que possam acarretar desabastecimento de gêneros necessários à população. Por exemplo, cargas de defensivos agrícolas necessários à pulverização em lavouras, visando a prevenção, controle e erradicação de pragas dos vegetais.

No mesmo sentido, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) publicou a Portaria nº 116, de 27/03/2020, que especifica produtos, serviços e atividades essenciais para garantir o pleno funcionamento das cadeias produtivas de alimentos, bebidas e insumos agropecuários durante a pandemia do Coronavírus, elencando:

I – transporte coletivo ou individual de funcionários destinados às atividades acima destacadas, sendo realizado por empresas de transporte público ou privado;

II – transporte e entrega de cargas em geral;

III – produção, distribuição e comercialização de combustíveis e derivados;

IV – produção e distribuição de alimentos, bebidas e insumos agropecuários com especial atenção ao transporte e comercialização de produtos perecíveis;

(…)

VI – prevenção, controle e erradicação de pragas dos vegetais e de doença dos animais;

(…)

IX – estabelecimentos de beneficiamento e processamento de produtos agropecuários;

X – estabelecimentos para produção de insumos agropecuários, sendo eles fertilizantes, defensivos, sementes e mudas, suplementação e saúde animal, rações e suas matérias primas;

XI – estabelecimentos para fabricação e comercialização de máquinas, implementos agrícolas e peças de reposições;

(…)”

No mesmo sentido, o Decreto nº 55.154, de 1º/04/2020, do Governo do Estado do Rio Grande do Sul, considerou atividade essencial, cujo fechamento fica proibido, as relacionadas a:“prevenção, controle e erradicação de pragas dos vegetais e de doença dos animais”, bem como as atividades acessórias e de suporte indispensáveis à atividade, tais como: limpeza, asseio e manutenção de equipamentos, instrumentos, vestimentas e estabelecimentos; produção, importação, comercialização, transporte, disponibilização, reparo, conserto, substituição e conservação de equipamentos, implementos, maquinário ou qualquer outro tipo de instrumento, vestimentas e estabelecimentos; produção, importação, comercialização, transporte e disponibilização de todo e qualquer tipo de insumos, em especial os químicos, petroquímicos e plásticos; produção, importação, comercialização, transporte e disponibilização de todo e qualquer tipo de peças para reparo, conserto, manutenção ou conservação de equipamentos, de implementos, de maquinário ou de qualquer outro tipo de instrumento, de vestimentas e de estabelecimentos.

Por óbvio que a essencialidade da atividade não desobriga as empresas de aviação agrícola à observância das regras sanitárias e de distanciamento mínimo, constantes do Decreto Estadual, a saber:

  1. a) distanciamento social, com restrição de circulação, visitas e reuniões presenciais (aglomerações) de qualquer tipo ao estritamente necessário;
  2. b) cuidados pessoais, sobretudo da lavagem das mãos, antes e após a realização de quaisquer tarefas, com a utilização de produtos assépticos, como sabão ou álcool em gel setenta por cento, bem como da higienização, com produtos adequados, dos instrumentos domésticos e de trabalho;
  3. c) etiqueta respiratória, cobrindo a boca com o antebraço ou lenço descartável ao tossir ou espirrar;
  4. d) adoção de sistemas de escalas, de revezamento de turnos e de alterações de jornadas, para reduzir fluxos, contatos e aglomerações de seus funcionários, e afastamento destes quando houver suspeita de possível contaminação pelo coronavírus, quando do regresso de localidades em que haja transmissão comunitária ou quando apresentem sintomas da doença, também descritos no Decreto: febre, tosse, dificuldade para respirar, produção de escarro, congestão nasal ou conjuntival, dificuldade para deglutir, dor de garganta, coriza, saturação de O2 < 95%, sinais de cianose, debatimento de asa de nariz, tiragem intercostal  e dispneia.

No mesmo sentido, já havia determinado a Portaria nº 116, do MAPA: “Todas as atividades devem considerar rigorosamente as diretrizes de segurança mínima estabelecidas para conter o avanço do COVID-19 apresentadas pelo Ministério da Saúde, bem como as prescrições previstas no Regulamento Sanitário Internacional Anexo ao Decreto nº 10.212, de 30 de janeiro de 2020, definidos na 58ª Assembleia Mundial de Saúde.”

Ainda, no que se refere à prevenção no ambiente de trabalho, o Ministério Público do Trabalho e o Poder Judiciário vêm exigindo das empresas a comprovação da adoção destas e de outras medidas, principalmente com o reforço das orientações de saúde e higiene, que deve ser realizado pelos serviços de segurança e medicina do trabalho das empresas, e a já referida disponibilização de materiais de higiene.

Especificamente no que pertine à flexibilização das jornadas de trabalho e afastamento de empregados integrantes dos grupos de risco, as Medidas Provisórias nº 927 e 936/2020, publicadas, respectivamente, em 22 de março e 01 de abril de 2020, trouxeram algumas possibilidades:

– Medida Provisória 927/2020, trouxe a possibilidade de antecipação de férias, individuais ou coletivas, adoção de banco de horas e trabalho em home office, para as atividades que permitam;

– Medida Provisória 936/2020, previu a redução proporcional da jornada de trabalho e da remuneração dos empregados, e a suspensão temporária do contrato de trabalho. Em ambos os casos, os empregados receberão o Benefício Emergencial para Preservação do Emprego e da Renda, subsidiado pelo Governo Federal.

Importante referir que a Medida Provisória 936, inicialmente, previa a possibilidade de adotar tais medidas por meio de acordo individual entre empresa e empregado.

Entretanto, em liminar concedida em 06/04/2020, em Ação Direta de Inconstitucionalidade proposta pela Rede Sustentabilidade, o Ministro Ricardo Lewandowski, do STF, condicionou a validade de tais medidas à comunicação, pela empresa ao sindicato da categoria profissional, da realização de acordo individual, possibilitando assim ao sindicato dar início à negociação coletiva. Caso o Sindicato não se manifeste dentro do prazo legal, o acordo individual ficará convalidado.

De qualquer forma, o único meio da garantir segurança jurídica aos acordos é a negociação coletiva, pois a constitucionalidade da Medida Provisória 936 é questionada, uma vez que desrespeita o artigo 7º, inciso VI, que prevê a irredutibilidade salarial, salvo acordo ou convenção coletiva de trabalho.

Portanto, não há qualquer dúvida acerca da essencialidade da atividade de aviação agrícola e das atividades acessórias e de suporte desta, desde que observadas as regras especiais editadas para este momento de excepcionalidade.

Em caso de eventuais Decretos Municipais que proíbam a atividade ou ato administrativo de interdição da mesma, a assessoria jurídica do SINDAG está à disposição para, judicialmente, buscar a reversão de tais medidas, assegurando o regular funcionamento das empresas, bem como para o auxílio na solução das necessidades de ordem trabalhista, com observância das normas legais.

Ricardo Luís Schultz Adede y Castro – OAB/RS 58.941 | Mariana Goes OAB/RS 60.851