13 de outubro de 2022

Repórter Brasil falha (muito) em reportagem sobre o setor

Sobre a reportagem “SP: Cidades onde aviões lançam agrotóxicos têm maior incidência de câncer”, publicada pela agência Repórter Brasil nessa quinta-feira (12 de outubro):

Na prática, temos uma pesquisa que diz que 30% dos produtos aplicados seriam considerados cancerígenos (ainda assim, com algumas contestações da Anvisa, conforme respostas no texto original da Repórter Brasil).

A partir daí, é por conta da reportagem pecar bastante na relação causa/consequência e forçar a barra para o lado da aviação agrícola.

De cara, pela citação da própria pesquisadora autora do estudo (a engenheira química Sônia Hess, da da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC), mencionada ainda no início da reportagem: “Não posso afirmar que a pulverização está causando câncer nessas regiões, mas o que a nossa análise mostra, é que esse é um fator de risco e que existe câncer acima da média nessas regiões.”

Primeiro, é importante considerar que os produtos aplicados por aviões são os mesmos usados por aplicadores terrestres – desde tratores até pulverizadores costais (aquelas mochilas, com o aplicador a pé na lavoura). O que vale para todos os tipos de lavouras e com exatamente os mesmos riscos – inclusive o de deriva, que quando o produto se desvia do alvo quando não são observadas as condições climáticas (vento, umidade e temperatura ambiente). Aliás, aí o avião ainda leva vantagem por sua velocidade, já que consegue terminar o serviço antes que se altere a janela meteorológica.

Assim, problemas de contaminação são causados quase sempre por problemas de boas práticas em campo, independente da ferramenta e do tamanho da área ou tipo de lavoura onde são feitas aplicações de agrotóxicos. Como, aliás, ficou claro na audiência pública promovida pelo próprio Ministério Público, no último mês de setembro, em Piracicaba/SP.

Porém, um dos diferenciais da aviação é justamente o fato dela ser o único meio de aplicação de produtos na lavoura com regulamentação específica e ampla. Que cobra desde formação técnica de seu pessoal até a existência de pátio de descontaminação nas empresas (onde as aeronaves e equipamentos são lavados e a água residual vai para um sistema de tratamento).

Ou seja, menor risco de contaminação.

Além disso a aviação é a única ferramenta que gera registros minuciosos de todas as suas operações. Indicando não só o produto aplicado e sua quantidade, mas também identificando o piloto agrícola, o engenheiro agrônomo coordenador e o técnico agrícola presente em campo (personagens obrigatórios em todas as aplicações feitas por aviões e todos com formação específica para a atividade). Registro esse que abrange também o mapa georreferenciado da área atendida e inclusive o mapa do DGPS da aeronave, indicando cada faixa aplicada.

Documentação cujos originais ficam obrigatoriamente na empresa, à disposição de qualquer fiscalização de agentes públicos – estaduais, federais e até do Ministério Público e seguidamente fiscais do MAPA, IBAMA e departamentos de Meio Ambiente e Vigilância Sanitária dos Estados visitam as empresas, especialmente em São Paulo. Até porque a simples falta do relatório já significaria pesadas multas. Além do fato dessas informações poderem ser cruzadas com outras formas de controle no rastreio de agrotóxicos, aprimorando ainda mais a capacidade dos agentes fiscais em localizarem eventuais falhas.

Além disso, o resumo de cada relatório é enviado mensalmente ao Ministério da Agricultura. Isso desde os anos 80 (com dados em papel) e que agora na versão digital, com a implantação de uma plataforma específica no Sistema Integrado de Produtos e Estabelecimentos Agropecuários (Sipeagro). Considerando ainda que a plataforma digital vinha sendo há décadas uma demanda do próprio setor aeroagrícola, justamente para se ter dados estatísticos amplos da atividade.

Lembrando que, quando o avião opera, ninguém está na lavoura e o próprio piloto trabalha em cabine fechada. Levando-se em conta ainda que, segundo estimativas do Sindag, a aviação é responsável por cerca de 30% das aplicações realizadas nas lavouras brasileiras. E que, na cana, por exemplo, ela entra especialmente nos estágios finais da plantação, quando a lavoura esta alta e cerrada. 

Além de toda a fragilidade já existente na relação feita entre a aviação e os casos de câncer (isso na matéria, já que a própria pesquisadora não faz essa relação), é importante ressaltar ainda que milhares de pessoas procuram a região onde foi feito o estudo (inclusive indo residir ali por um tempo, entrando em estatísticas locais) por causa do Hospital do Câncer de Barretos (hoje chamado Hospital de Amor). Instituição que é referência para pacientes inclusive de fora do País e que faz mais de 4 mil atendimentos diários – sendo a unidade de maior número de atendimentos no País nessa especialidade.

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