24 de fevereiro de 2023
Fao realiza treinamento de operações aeroagrícolas contra gafanhotos
Movimentação da agência da Onu foi promovida na Arábia Saudita, dentro de programa que abrange países da África e Oriente Médio contra praga que praticamente todos os anos ameaça a segurança alimentar das populações na região
A Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (Fao) conclui nessa quinta-feira (23) um workshop de pulverização aérea contra gafanhotos, na Arábia Saudita. A movimentação ocorreu na cidade de Jeddah, às margens do Mar Vermelho (a leste do país). O treinamento faz parte do calendário anual de ações de monitoramento e combate a nuvens de gafanhotos do deserto na região da África e Oriente Médio. Outro treinamento de combate aéreo à praga está marcado para outubro (dias 23 a 28) no Marrocos (norte da África).
A movimentação integra um calendário de ações das Comissões para Controle dos Gafanhotos do Deserto na Regiões Ocidental (abrangendo Argélia, Mali, Marrocos, Mauritânia, Níger Senegal, Chade e Tunísia) e Central (Sudão, Eritreia, Etiópia, Egito e Arábia Saudita) da Fao, em parceria com os governos locais. Os encontros (realizados em conjunto ou separadamente em cada região) preveem também treinamentos sobre o uso de drones no monitoramento dos insetos (marcado para 25 de setembro a 7 de outubro em Nuaquechote, na Mauritânia), além de cursos sobre plataformas online de vigilância, gerenciamento de emergências e outros temas.
AÇÕES CONTÍNUAS
Em 2020, a Agência da Onu já havia realizado um treinamento online para técnicos do Chade, Níger, Mali e Mauritânia para gestão de base aérea de operações contra gafanhotos. Naquele ano, o leste africano (especialmente Somália, a Etiópia, Eritreia, Djibouti e o Quênia) e o Iêmen, na Península Árabe, passaram pela maior praga de gafanhotos em 25 anos. Para fazer frente à crise, a Fao chegou a mobilizar US$ 230 milhões em operações terrestres e aéreas em 2,3 mil hectares nos países atingidos – o que chegou a envolver cerca de 20 aeronaves trabalhando simultaneamente, com pilotos de diversas nacionalidades. A praga de 2020 teve como pano de fundo a questão climática e os insetos chegaram até o Paquistão – onde o governo também aposto no combate aéreo à praga, em uma área de 20 mil hectares.
Conforme o órgão das Nações Unidas, o esforço concentrado na África conseguiu evitar a perda de 4,5 milhões de toneladas em safras, garantindo também pastagem para a produção de 900 milhões de litros de leite. O que garantiu alimentos para 42 milhões de pessoas em uma das regiões mais pobres do planeta. Em cifras, o valor da quantidade de cereais e leite salvos foi estimada pela Onu em US$ 1,77 bilhão.
Além disso, as Comissões de Controle de Gafanhotos do Deserto realizam encontros de avaliações a cada temporada de gafanhotos, buscando compartilhar expertise e incorporar tecnologias para o planejamento e ações de campo. Por exemplo, no caso da aviação, incorporando aviões agrícolas também nos levantamentos de longo alcance dos insetos e apostando em DGPSs de última geração e sistemas SIG (EarthRanger) para coordenar equipes em terra e aéreas. Além de recomendações sobre adaptações nas legislações de cada país sobre uso de drones, registro de produtos químicos ou biológicos usados contra os insetos e outras orientações.
A contratação de empresas aeroagrícolas pela Fao para o combate a gafanhotos na África ocorre pelo menos desde os anos 1990. E desde o início dos anos 2000 faz parte das estratégias permanentes de combate à praga no continente. Desde os tempos bíblicos, o gafanhoto do deserto (Schistocerca gregária) é possivelmente a mais voraz praga do continente africano e de parte do Oriente Médio e Ásia. A espécie pode viajar até 150 quilômetros por dia em grandes nuvens. Uma fêmea pode colocar 300 ovos ao longo de sua vida e mesmo um pequeno grupo pode consumir em pouco tempo alimento suficiente para alimentar cerca de 3,5 mil pessoas.
AMÉRICAS
Além disso, grandes surtos de gafanhotos (de diferentes espécies) foram determinantes para o surgimento da aviação agrícola em pelo menos cinco países, entre as décadas de 1920 e 1940: Argentina, Uruguai, Brasil, Austrália e Paraguai. Aliás, por aqui grandes nuvens da espécie Schistocerca cancellata colocaram em alerta a aviação agrícola no Rio Grande do Sul em 2020. Especialmente o grupo de insetos que em junho chegou até a província de Corrientes, na divisa com o Rio Grande do Sul – vinda da região da tríplice fronteira entre Argentina, Paraguai e Bolívia (onde é o nascedouro natural dos insetos).
O deslocamento atípico (no embalo das correntes quentes) colocou Santa Catarina e Rio Grande do Sul em emergência fitossanitária. Os gafanhotos acabaram eliminados na fronteira entre a Argentina e o Uruguai, depois de terem feito caminho parecido com o da praga que em 1947 determinou o surgimento da aviação agrícola no Brasil – para interceptar os insetos já em Pelotas, no sul do Estado.
Já novembro do ano passado, Agentes da Secretaria da Agricultura, Pecuária e Desenvolvimento Rural do rio Grande do Sul (Seapdr) participaram de um treinamento na Argentina, aperfeiçoando as técnicas de monitoramento e controle de nuvens de gafanhotos. As aulas foram promovidas pelo Serviço Nacional de Sanidade Agroalimentar e Qualidade do país vizinho (Senasa), com apoio do Comitê de Sanidade Vegetal do Mercosul (Cosave).
Nesse meio tempo, na Guatemala, outra espécie de gafanhoto, a Schistocerca picifrons (que ocorre também na América do Norte), já havia deixado o país em emergência fitossanitária em fevereiro 2021. O próprio Ministério da Agricultura guatemalteco organizou operações de pulverizações aéreas e terrestres para combater as nuvens de insetos.
Antes disso, em setembro de 2020, El Salvador também sofreu com ataque de gafanhotos e chegou a receber ajuda do México para combater a praga. O governo mexicano enviou a cepa do Metarhizun acridium, para ser replicada nos laboratórios salvadorenhos. Trata-se um agente biológico para ser aplicado contra os insetos.